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GESTÃO DE TEMPO ENTRE ACADÊMICOS DE MEDICINA: O DILEMA ENTRE A OTIMIZAÇÃO DA PRODUTIVIDADE E O ESGOTAMENTO FÍSICO E MENTAL

GESTÃO DE TEMPO ENTRE ACADÊMICOS DE MEDICINA: O DILEMA ENTRE A OTIMIZAÇÃO DA PRODUTIVIDADE E O ESGOTAMENTO FÍSICO E MENTAL

27/MAI/2021

Carreira Médica

O gerenciamento do tempo tem se mostrado uma tarefa cada vez mais central na sociedade contemporânea. O ambiente, em constante mudança, é um fator determinante do comportamento individual e gera desafios para o acompanhamento dessas transformações em tempo hábil. A forma como se lida com as atividades e se responde às crescentes demandas parece não ter sido bem adaptada pelo ser humano, visto que, o ritmo acelerado da sociedade da informação gera ainda mais pressão sobre a realização de tarefas, causando uma busca incessável por mais horas e menos interrupções. Especialmente no ambiente acadêmico, tal comportamento pode ser visto de maneira mais elucidativa. Nota-se, no entanto, que a busca obsessiva por produtividade trouxe impactos significativos sobre a qualidade de vida dos estudantes, especialmente, mas não exclusivamente, os da área da saúde¹.

 

O excesso de informação pode ser entendido como um dos grandes vilões no gerenciamento do tempo. No entendimento de Lima (2003), o advento da informatização provocado, em grande parte, pela modernização dos modos comunicação, causou um grande impacto nas pessoas, pois tornou a vida do homem muito dinâmica e estressante, gerando a sensação de “falta de tempo” e a insatisfação pessoal, por não conseguir se dedicar plenamente em uma atividade em específico. Por consequência, causando redução da produtividade, qualidade de vida e desempenho pessoal e profissional². 

 

De acordo com a Organização Mundial da Saúde, a prevalência de sintomas de ansiedade e depressão tem aumentado constantemente nos últimos anos. Os estudantes de medicina não estão imunes a esse fenômeno. Na verdade, é amplamente reconhecido que eles representam uma população em risco de grande angústia, esgotamento e sofrimento psicológico. Níveis de estresse altos ou extremamente altos têm sido relatados em estudos realizados em todo o mundo, como uma causa para o aumento do risco de desenvolver burnout, pensamentos suicidas, distúrbios do sono, abuso de álcool e distúrbios ansioso-depressivos. Essas taxas são notavelmente altas e acima das encontradas na população em geral; também estão acima dos relatados por alunos de outros cursos de graduação³. 

 

As possíveis causas desse alto nível de estresse podem ser atribuídas a vários fatores, tanto sociodemográficos, como gênero, situação econômica e formação cultural, quanto acadêmicos, como alta carga de trabalho, número de horas gastas em aulas curriculares e estágios hospitalares, ambiente competitivo, assuntos complexos e mnemônicos e exames frequentes. Além disso, estar exposto a interações complexas com pacientes e parentes pode aumentar a carga psicológica e emocional do curso de graduação4. 

 

Estresse, ansiedade e depressão também estão associados ao fenômeno de burnout, descrito pela primeira vez em profissionais de saúde, definido pela presença de exaustão emocional, despersonalização e baixa realização pessoal. Médicos, pós-graduados e estudantes de medicina estão particularmente sob risco de burnout, o que prejudica o desempenho, aumenta os erros médicos, diminui as habilidades operacionais e afeta negativamente o relacionamento com os pacientes. Entre estudantes de medicina, o esgotamento pode causar baixo desempenho nos estudos, isolamento social e, por fim, abandono da universidade³.

 

A produtividade, sobretudo em cursos como a medicina, está diretamente relacionada às bases capitalistas da sociedade, além das demandas da universidade, tendo como foco a quantidade e agilidade, seguindo o modelo mercadológico. Imersos em diversas tarefas, os estudantes se veem perdidos e pressionados pela produção de conteúdos padronizados, que, segundo a universidade, está relacionado a uma boa formação5.

 

Em segundo plano, tem-se a pressão do meio acadêmico para publicação de inúmeros artigos científicos, como forma de reconhecimento do desempenho do pesquisador6. Essa pressão leva os acadêmicos a priorizarem a quantidade ao invés da qualidade dos trabalhos produzidos e, dessa maneira, cria-se uma geração de estudantes mais preocupada com a elaboração de um currículo completo do que com a experiência acadêmica em si - os interesses particulares são frequentemente deixados em segundo plano, por serem considerados de menor importância.

 

Nesse sentido, a gestão do tempo no contexto educacional vem ganhando cada vez mais importância, uma vez que a educação formal exige mais autonomia por parte das pessoas. A flexibilidade das opções de estudo, marcada pela crescente substituição das aulas ao vivo por aulas virtuais, também exige que o aluno assuma uma postura ativa na gestão do tempo, visto que deverá definir o seu próprio ritmo de estudos e aulas. Assim, os estudantes que não conseguirem fazê-lo de forma eficaz podem enfrentar dificuldades ao longo de sua trajetória acadêmica. No intuito de atender a tal propósito, torna-se necessário que o indivíduo planeje estratégias, táticas e ações de forma sistematizada, conciliando aspectos de sua vida pessoal e profissional7.

 

Os estudos dedicados à pesquisa da administração do tempo destacam diferentes linhas de pensamento que, em geral, apresentam princípios básicos similares: organização, controle e priorização. A essência das ideias na área de gestão do tempo pode ser capturada em uma única frase: organize e execute conforme a prioridade. Essa frase representa a evolução de quatro gerações da teoria de gestão do tempo. A primeira geração caracterizou-se pela criação de bilhetes e listas, em um esforço de sistematizar as demandas feitas sobre o tempo e energia das pessoas. Já a segunda geração caracterizou-se pelo uso de calendários e agendas, refletindo a tentativa de marcar eventos e atividades no futuro. Por sua vez, a terceira geração adiciona às gerações anteriores a ideia de prioridade, metas, planejamento diário e elaboração de plano para conquista dessas metas e atividades. Recentemente, emergiu uma quarta geração, na qual o norte-americano Stephen Covey se destaca pela proposição da matriz de Gerenciamento do Tempo. Dentro dessa perspectiva, o autor distribui as atividades em quatro quadrantes, conforme critérios de importância e urgência. Afirma que uma atividade pode ser: urgente e importante; não urgente e importante; urgente e não importante; não urgente e não importante7.

 

Evidentemente, a adoção de uma ou outra estratégia parte de uma análise muito particular do indivíduo, sendo que alguns aspectos como a experiência de vida, treinamentos ou a prática cotidiana parecem ser relevantes para a incorporação de tais elementos. No entanto, o planejamento parece ser a característica mais fundamental da gestão do tempo, ou seja, o indivíduo necessita decidir quais tarefas irá desempenhar, definir a prioridade de cada uma e lidar com as possíveis distrações na execução das mesmas para organizar seu tempo. A partir daí, outras competências como a definição de objetivos, estabelecimento de planos, a composição de listas de atividades, o manejo de imprevistos e o cumprimento de prazos podem ser desenvolvidas de maneira mais consistente. 

 

Torna-se evidente que a otimização de atividades importantes no cotidiano está propriamente relacionada ao sucesso profissional e pessoal. Contudo, a dificuldade em gerenciar o tempo e organizar atividades ainda é um obstáculo para a maioria dos estudantes da graduação. Tal empecilho evidencia a necessidade de mudanças de hábitos, atitudes e comportamentos, além de requerer o uso de ferramentas adequadas para conquistar o objetivo, de maneira que se aproveite as oportunidades, para melhorar a produtividade, qualidade de vida e o desempenho¹. 

 

Autoria: Comissão Ensino Médico: Catharina Ribeiro Guimarães e Frederico Moreira Man Fu


REFERÊNCIAS:


RODRIGUES, Alexsandro Sutil. O Gerenciamento do tempo aplicado na produtividade, qualidade de vida e desempenho: análise de publicações nacionais resultantes da base de dados do Portal de Periódicos Capes e Google Acadêmico. 2018. Trabalho de Conclusão de Curso (Bacharelado em Administração) – Faculdade de Administração, Ciências Contábeis e Economia, Universidade Federal da Grande Dourados, Dourados, MS, 2018.
Lima, A. C. T. (2003). Administração do tempo uma questão de planejamento (Monografia de especialização, Universidade Candido Mendes, Rio de Janeiro). Recuperado de http://www.avm.edu.br/monopdf/22/ANA%20CRISTINA%20TRINDADE%20LIMA.pdf
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